18 de setembro de 2011

Androginia

 Neste post, deixo as palavras retirada de um artigo apresentado no colóquio falarem por mim. 

Entre o n(ex)o e o s(ex)o: formação de sentido, gênero e cultura das aparências
Marco Antônio Vieira

"Ainda que tomemos de empréstimo construtos de Lacan e de Judith Butler para falarmos desse mistério que é puro gris, pois que se encontra numa zona fronteiriça, numa zona litoral e o que é esta margem entre a água e a terra senão isto a que se chama fronteira?...
Andrej Pejic 2011 

...androginias. Uma vez que a roupa e a construção da aparência são máscara e encenação, as estruturas sígnicas atreladas à apresentação do macho ou da fêmea em nossa espécie são pura construção formal, situadas historicamente, dados da cultura de um período e civilização.
Ao analisarmos o panorama de imagens do passado da civilização ocidental, constata-se o quão infinitamente mais paramentados e enfeitados eram os homens do passado. Mesmo em Roma, onde , como se sabe, imperava certa austeridade no tocante às roupas, quando se comparam os romanos aos bizantinos, por exemplo, um senador era incapaz de vestir-se sem o auxílio de um servo encarregado de recobrir e envolver o corpo de seu amo com cerca de 6m de tecido. Cabe ainda lembrar que só os cidadãos romanos podiam trajar a toga e, portanto, excluíam-se deste privilégio societal, as mulheres, o que assinala o quanto o gênero sempre esteve associado às estruturas autorizadoras do poder na sociedade.
Jóias, maquiagem, penteados cobriam os corpos de mulheres e homens nas civilizações antigas de forma quase indistinta, com a possível ressalva de que aos homens à frente destas civilizações, seus monarcas, faraós, cabia maior dose de esplendor. A maioria destas civilizações, cabe lembrar, eram falocêntricas. Entre os animais, são os machos, como no caso de muitos pássaros, que se valem da exuberância de seus corpos para seduzir as fêmeas. Não se pode esquecer que um dos maiores ícones da moda na civilização ocidental foi um homem, Louis XIV, o Rei Sol, que esteve à frente da França Barroca e foi um grande amante do salto alto.
...O século XX abole em alguns momentos algumas dessas convenções e torna-se então um palco em que novas cenas para a apresentação da sexualidade se encenam.As fronteiras entre o masculino e o feminino começam a borrar-se intensamente e a um só tempo seduzem e assombram pelo mistério que comportam...
...Não existimos, portanto, a não ser como meios, mensagens de algo para alguém. Irremediavelmente fadados à redução linguageira, ao falar, ao interpretar uma imagem, evocam-se redes de significação outrora tramadas.
É o Outro da linguagem que fala por nós: rios de fios, novelos perdidos mas que não cessam de tramar-se a novas redes produzindo outros surtos de significação: Passado, presente e futuro confundem-se assim e aqui.
...O corpo-vestido masculino encontra-se hoje em um entre-lugar, o que significa que também a mulher se depara com as imagens encarregadas de traduzir a feminilidade em suspensão. Ocorre que, por uma espécie de esgotamento dos recursos e possibilidades de composição do design de moda feminino até por conta mesmo do fato de que o corpo-vestido masculino permaneceu, em linhas gerais, congelado e engessado, uma espécie de hibernação desde o século XIX, os olhares da moda voltam-se agora àquilo que pode advir do design de moda para o corpo do homem. É natural, portanto, que se abra uma palheta de possibilidades até há pouco tempo interditada ao universo masculino: inusitadas e incomuns combinações cromáticas, têxteis e formais, que incluem: saias–adotadas pelo Diretor de Criação da Louis Vuitton Marc Jacobs em suas últimas aparições públicas, calças de inspiração orientalista (Osklen, Mário Queiroz, Akihito Hira), paetês (Alexandre Herchcovitch), para citar apenas algumas das marcas e criadores que se aventuraram na busca de novas traduções do corpo-vestido masculino...
...O Design de Moda, nestes contextos, assume o papel de tradutor visual de novos olhares tramados sobre os lugares vestimentais do homem e da mulher. Trata-se, em outras palavras, de quase-manifestos, de defesas públicas de teses acerca de como se pode olhar um homem, a partir da maneira, modus, factio que ele se apresenta por meio de como recobre, envolve e adorna seu corpo´´.

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